Ministério Público de Rondônia intensifica ações para frear a escalada da violência contra as mulheres

Ministério Público de Rondônia intensifica ações para frear a escalada da violência contra as mulheres

Mesmo com o avanço das leis de proteção à mulher, o Brasil tem visto crescer o número de feminicídios.
De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em julho deste ano, o país registrou 1.492 mulheres assassinadas por motivação de gênero, um aumento de 0,7% em relação ao ano anterior.

As tentativas de feminicídio também cresceram de forma alarmante: foram 3.870 casos, o que representa alta de 19%.

Os dados revelam ainda que oito em cada dez assassinatos foram cometidos por companheiros ou ex-companheiros; 64% das vítimas morreram dentro de casa e 97% foram mortas por homens. A violência psicológica também aumentou — 51.866 mulheres sofreram esse tipo de agressão, um crescimento de 6,3%. A maioria das vítimas era negra (63,6%) e tinha entre 18 e 44 anos (70,5%). Outro dado alarmante: em 2024, mais de 101 mil medidas protetivas foram descumpridas no Brasil.

Rondônia: Um dos estados mais fatais

Rondônia tem contribuído de forma significativa para esses números nacionais. De acordo com dados do Mapa da Violência Doméstica, do Ministério Público de Rondônia (MPRO), lançado este ano, até o momento já são 20 casos de feminicídio, representando um aumento de 42,86% em relação a 2024, quando foram registrados 14 casos.

A capital Porto Velho lidera o ranking com seis ocorrências, seguida de Itapuã do Oeste, Presidente Médici, Buritis, Vilhena e Ji-Paraná, com dois casos cada. Também registraram feminicídios neste ano Santa Luzia D’Oeste, Governador Jorge Teixeira, Mirante da Serra e Cujubim.

De 2022 a 2025, Itapuã do Oeste apresentou o maior crescimento no número de assassinatos de mulheres: 46 casos, o dobro de Santa Luzia do Oeste (26). Na sequência estão Governador Jorge Teixeira (24), Mirante da Serra (21), Presidente Médici (20) e Buritis e Cujubim (14 cada).

ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE RONDÔNIA

Diante dessa realidade, o Ministério Público de Rondônia (MPRO) tem desenvolvido, nos últimos anos, uma série de ações integradas com outros órgãos e instituições para fortalecer as políticas de proteção às mulheres e reduzir os índices de feminicídio no estado.

Algumas ações de destaque em 2025:

  • Encontro com órgãos estaduais para tratar de recomendação do Ministério Público Federal (MPF), que cobra do Estado um plano completo de combate à violência contra a mulher e melhorias nas Delegacias da Mulher do interior.
  • Integração interinstitucional via Rede Lilás, reunindo representantes do Judiciário, Segurança Pública, Assistência Social e sociedade civil para alinhar estratégias de atuação e fortalecer o Agosto Lilás.
  • Lançamento da nova plataforma digital “Mapa da Violência Doméstica”, ferramenta integrada de suporte e monitoramento de casos em todo o estado.
  • Além de campanhas educativas e ações itinerantes em municípios do interior, como Ariquemes, com palestras, rodas de conversa, atividades em escolas, envolvimento de lideranças religiosas e o projeto “Face a Face”, voltado para homens com medidas protetivas.

“A prevenção é responsabilidade de todos”

Em entrevista ao programa Expresso 103, a promotora de Justiça Tânia Garcia, coordenadora do Núcleo de Apoio às Vítimas (NAVIT) e titular da Promotoria de Violência Doméstica, falou sobre a importância das ações do MP nessa luta contra o feminicídio:

“O Ministério Público tem pelo menos quatro períodos de muita ação ativista de combate às violências de gênero que afetam meninas e mulheres. A gente começa em março, com o mês da mulher; em maio temos a questão da violência sexual contra crianças e adolescentes — e a maioria das vítimas são meninas de 10 a 14 anos. Em agosto, temos o ‘Agosto Lilás’, mês do aniversário da Lei Maria da Penha, e, por fim, os 21 dias de ativismo, que trazem a pauta das lutas pelo fim da violência contra as mulheres. Dentro desses 21 dias, também abordamos o protagonismo masculino, celebrado em 6 de dezembro, e a questão racial, com o Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro”, explicou a promotora.

A promotora também chama atenção para um dado alarmante:

“A violência de gênero tem cor no Brasil. As mulheres que mais morrem e sofrem violência são mulheres negras. Por isso, além do acolhimento e da atuação jurídica, trabalhamos o aperfeiçoamento dos serviços e a mobilização da sociedade. A prevenção e o enfrentamento à violência de gênero são responsabilidades de todos — do cidadão, da mídia, da Igreja, das instituições e da comunidade.”

Por trás dos números: Vozes que sobreviveram

As ações do Ministério Público ganham ainda mais sentido diante das histórias de dor, medo e superação de mulheres que conseguiram escapar da violência.

Ana Paula (nome fictício), professora de 32 anos, relata:

“No começo, ele era carinhoso e atencioso. Depois começou a controlar minhas roupas, meus amigos e até o que eu postava nas redes sociais. Vieram os empurrões, os gritos, e um dia ele me bateu de verdade. Tive medo de denunciar, achava que ninguém ia acreditar. Só consegui sair quando uma vizinha chamou a polícia. Hoje, com apoio psicológico e do grupo de apoio, estou reconstruindo minha vida. O medo ainda existe, mas agora sei que não estou sozinha.”

Jéssica, de 25 anos, também sobreviveu após anos de violência:

“Eu tinha vergonha de contar. Ele dizia que me batia porque me amava, que era culpa minha. Até que um dia ele me deixou trancada em casa por quase dois dias. Consegui fugir quando ele saiu para trabalhar. Liguei para o 180 e fui levada a uma casa de acolhimento. Fiz terapia, voltei a estudar e quero usar minha história para mostrar que o amor não machuca. Denunciar salva vidas.”

Ana Sasha também enfrentou a violência até decidir se libertar:

“A gente discutia várias vezes em casa. Já teve empurrões, puxões de cabelo e agressões verbais constantes. Resolvi me separar, disse que não aceitava mais aquela vida. Foi então que ele começou a me perseguir e eu não tive mais paz.”

Ações que ajudam a entender o problema e buscar soluções

O MAPA QUE ORIENTA A PROTEÇÃO

Por tudo isso, as ações não podem parar.

O Mapa da Violência Doméstica, lançado este ano pelo MPRO, é uma ferramenta que oferece uma leitura precisa do contexto da violência contra meninas e mulheres em Rondônia.

“O Mapa é como uma bússola que orienta nossa atuação. Ele reúne dados sobre localização, perfil das vítimas e agressores, tipos de violência e reincidência. Essas informações subsidiam o trabalho dos promotores e fortalecem a fiscalização das políticas públicas de proteção à mulher”, explica a promotora Tânia Garcia.

A versão interna da plataforma permite acesso integral aos dados, possibilitando intervenções com gestão de risco individualizada para cada caso, de forma mais ágil e eficaz.

Campanha “Agosto Lilás”: A informação que salva vidas

Assim como o Mapa da Violência Doméstica, vem mostrando os números que assustam e mostram a realidade, praticamente em tempo real, do que está acontecendo; por outro lado a campanha “Agosto Lilás” deve ser a reposta para diminuir esses números, e já vem mostrando resultados expressivos. Com o tema “Não deixe chegar ao fim da linha. Ligue 180”, este ano a mobilização trouxe informação, encorajou denúncias e estimulou o envolvimento da sociedade.

Os números comprovam o impacto:
O Ligue 180 registrou aumento de 80,65% nos atendimentos em Rondônia em 2024 — foram 3.922 ligações, contra 2.171 em 2023. As denúncias formais subiram de 556 para 606, sendo 355 feitas pelas próprias vítimas e 251 por terceiros.
Em 231 casos, o crime ocorreu na residência da vítima ou do agressor.

Como pedir ajuda

Um local bem especial é a Sala Lilás, onde a mulher encontra o apoio necessário; a doutora Tânia explica a importância desse ambiente para a mulher.

“…ela pode vir diretamente à Sala Lilás, que é uma sala especializada para acolhimento e atendimento das mulheres que estão em situação de violência. A gente tem um protocolo que coloca em um acompanhamento, digamos, intenso, pela Sala Lilás. As mulheres estão em situação de violência repetitiva, já pediram medida, e a medida não está sendo respeitada. A gente precisa constantemente encaminhá-las para vários serviços e adotar medidas mais restritivas para o ofensor. Então, a gente tem um acompanhamento constante dessa mulher através da Sala Lilás.”

Em Rondônia, a vítimas também podem buscar ajuda no próprio Ministério Público e outros parceiros:

  • Ministério Público de Rondônia: (69) 3216-3996 / WhatsApp (69) 98408-9931
  • Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional RO: (69) 3217-2112 / WhatsApp (69) 99954-9260
  • Tribunal de Justiça de Rondônia: (69) 3309-7105 / WhatsApp (69) 98455-3277
  • Defensoria Pública do Estado: (69) 99208-4629
  • Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher: (69) 3216-8800
  • Polícia Militar: 190
  • Polícia Civil: 197

Mais que números, vidas em reconstrução

Os dados expõem uma ferida social profunda, mas também revelam a força das mulheres e o compromisso das instituições que lutam por elas.
A cada denúncia, uma vida pode ser salva.
A cada ação do Ministério Público, uma nova esperança se acende.

O desafio é grande — mas o silêncio não é mais uma opção.
A luta é de todos. Denunciar é o primeiro passo para salvar vidas.

Acompanhe a entrevista com a Dra. Tânia Garcia – coordenadora do Núcleo de Apoio às Vítimas (NAVIT) e titular da Promotoria de Violência Doméstica do MPRO, no player a baixo.

Por: Ray Lavareda

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